6 de out. de 2012

"Iron Maiden" (Iron Maiden, 1980)

Capa de "Iron Maiden", de 1980


Quem acompanha este blog já entendeu que o mais importante aqui é a história. E toda história tem uma origem. E muitas vezes, essa origem é inusitada e improvável. O Iron Maiden protagonizou um destes momentos improváveis no mundo da música. Principal responsável pelo "New Wave of British Heavy Metal", ou somente NWOBHM, é possível que seu líder, o baixista Steve Harris, não tivesse imaginado a proporção disso quando abriu mão de fazer o heavy metal tradicional e agregar elementos do punk rock, ideologia que ele detestava!


A BANDA

Ainda adolescente, Harris aprendeu sozinho a tocar contrabaixo, influenciado por bandas do heavy metal e do progressivo, como Black Sabbath, Yes, UFO, Genesis, Who e várias outras. Com esse rol de grupos complexos, era natural que ele procurasse ideias semelhantes. Só que ele deu um azar danado chamado "Punk Rock"! Quando ele incursava suas primeiras bandas, o movimento do "Do It yourself" estava a plenos pulmões, fazendo a cabeça dos jovens.

O DIY foi um balde de água fria para Harris, que ouviu "não" de vários grupos. Isso o irritava, pois além de não se identificar com o punk, ainda limitava sua ação. Decidido, em 1977 ele cria o Iron Maiden. Após inúmeras indas e vindas de músicos, firma com Dave Murray (guita) e Doug Sampson (batera), até conhecer Paul Di'Anno (vocal). Só tinha um problema: Di'Anno adorava punk!! Mas o Maiden já estava entravado, e já tinham sugerido "simplificar" o som tantas vezes, que o baixista decidiu ir na base do "vai tu mesmo".

Sem querer, Harris havia dado um golpe de mestre. Ao aceitar, ainda que relutante, a modificar o estilo do Maiden para um visual mais "sujo", e som mais simples e rápido, características do punk, agregado ao virtuosismo e à técnica comuns do metal e do progressivo, ele criou um estilo diferente. Era Heavy Metal... mas era algo mais. Depois, com a entrada de Dennis Stratton (guita) e de Clive Burr no lugar de Sampson, o Maiden gravaria seu primeiro disco.

Nascia o NWOBHM!



CONTEXTO HISTÓRICO

Quando eu decidi dar este viés a este artigo, do "acaso" que foi o surgimento do NWOBHM, comecei a procurar situações semelhantes na música. Só que, se você pensar bem, isso acontece o tempo todo, em vários âmbitos, em toda a história! Um exemplo clássico: a penicilina. O antibiótico descoberto por Alexander Fleming nada mais foi do que um prato de comida esquecido no laboratório! Após dias em decomposição, um fungo se desenvolveu ali. Este fungo era capaz de impedir a reprodução de bactérias! Totalmente sem querer!

Na cultura, tem até o nome pra isso: bricolagem. É quando você usa vários elementos pra criar outra coisa. No cinema, "Matrix" é exemplo. Os Wachowski usaram conceitos de várias religiões, filosofias e literaturas para compô-lo. Outro filme assim muito lembrado é "Bastardos Inglórios", do Quentin Tarantino. Tem um monte de referências a outros filmes, atores e diretores do passado.

Na música então... é assunto pra mais de mês! O Rock'n'Roll mesmo, aquele dos anos 50, de Chuck Berry e Little Richard, trazia misturas do blues, folk e gospel. O Progressivo, que citei antes, pegou isso e agregou jazz e música erudita. O grunge, do Nirvana e Pearl Jam, juntou o hard, punk, indie e uma pitadinha de leve de progressivo. O emo, que tanta gente zoa, agregou elementos do hardcore, punk, indie, grunge, gótico, pop... O Pop!! Quer melhor exemplo de bricolagem do que o pop? Acho que não existe!

Harris, sem dúvida, é destaque nestes exemplos de bricolagem na música. Por mais que ele relutasse em aceitar o punk, foi usar isso a seu favor que catapultou sua carreira e do Iron Maiden.



O DISCO

E logo de cara, logo que a primeira música abre, "Prowler", você já começa a perceber a influência de Di'Anno. Pegada, simples, rápida, ela poderia passar despercebida em qualquer disco de punk rock do mesmo período. Gostem os fãs do metal ou não, fica claro quando você percebe que a música inteira foi feita em cima de dois acordes só! Uma ou outra variação, mas basicamente é isso.

Certamente que o "dono da festa", Harris, não iria deixar fugir sua tendência. E ele faz isso na segunda faixa, "Remember tomorrow". Ao contrário de "Prowler", ela já demonstra a capacidade de virtuosismo do grupo. Bem mais cadenciada, com as linhas melódicas bem feitas e trabalhadas, Harris ainda não abandona sua origem, nesta que é uma das mais bonitas do disco.

Todo o "Iron..." parece conflitar essas duas tendências, as músicas mais elaboradas e virtuosas (como "Strange World" e a ótima "Phantom of the Opera") e momentos de pulso frenético e agilidade (ouvidos em "Sanctuary", "Iron Maiden" e o clássico "Running free"). E o disco segue sempre essa tendência, alterna momentos "punk" e outros "heavy", quase o tempo todo.

Posteriormente, o Maiden faria essa fusão de estilos com mais propriedade. Em "Iron..." as coisas ainda seguem razoavelmente divididas, com duas exceções. Uma é "Charlotte the Harlot", onde as duas tendências se equilibram bem. Outra é a instrumental "Transilvanya". Esta, pra mim, é a que mais lembra o que o Maiden viria a se tornar, fazendo a junção de estéticas de forma uníssona.

"Iron..." é um clássico. Esta formação não é a que os fãs conhecem como "a formação clássica", mas o disco é um de seus mais relevantes, e merece o destaque pela ousadia. Ainda que tal ousadia tenha sido meio que forçada!



LISTA DE FAIXAS

1. Prowler
2. Remember Tomorrow
3. Running Free
4. Phantom of the Opera
5. Transylvania
6. Strange World
7. Sanctuary *
8. Charlotte the Harlot
9. Iron Maiden

* "Sanctuary" não saiu na versão original britânica, somente na estadunidense. No relançamento de "Iron Maiden" em 1998, ela foi reposicionada para a faixa 2, entre "Prowler" e "Remember tomorrow".



AVALIAÇÃO (0-10)

Nota 8

13 de ago. de 2012

"Pussy Whipped" (Bikini Kill, 1994)

Capa de Pussy Whipped, de "1994"


É provável que você acessou este blog através de link no Twitter ou Facebook. Talvez você não saiba, mas esse tipo de mídia não existia há uns 8 anos. E como os jovens faziam pra se manifestar antes? Através de "fanzines"! Eles se tornaram febre por ser a voz da juventude, onde se manifestavam sobre todos os assuntos. E um dos temas que foi amplamente discutido neste meio no início dos anos 90 foi o feminismo. Da união deste tema com a música, surge um dos movimento mais relevantes de sua época: o Riot Grrrl.



A BANDA

Por volta de 1978, Kathleen Hanna vai com a mãe para Washington. Ela tem 9 anos. Em uma atividade, assiste a uma palestra de Gloria Steinem. Nela, a palestrante falou sobre feminismo e os direitos da mulher. Hanna aproveitou cada segundo, e se tornou fã de Steinem. Durante a juventude, passou a colecionar a revista que ela editorava, a "Ms.". Cortava os artigos de que gostava, e fazia montagens com alguns textos e frases suas. Em muitas delas, a frase era "Garotas podem fazer qualquer coisa".


Hanna então cresceu, e foi fazer faculdade de Fotografia em Olympia. Alí, iniciou sua militância feminista, e logo aprendeu a usar vários recursos pra difundir suas ideias, dos quais se especializou em recitais, música e fanzines. Assim, ela conhece posteriormente Tobi Vail, então baterista da banda Go Team e que colaborava para várias fanzines.

Ambas então decidem criar sua própria zine, que batizaram de "Bikini Kill", juntamente com outra estudante, Kathi Wilcox. Mas os zines eram pouco para o trio, de onde veio a ideia de formar uma banda com as três, mais o guitarrista da Go Team, Billy Karren. A difusão do feminismo inspirada pela filosofia "Faça Você Mesmo" (já citei isso aqui, e aqui), tomou proporções maiores, inspirando outras meninas (e meninos também) a mostrarem sua revolta por meio da música.

Era o nascimento do movimento "Riot Grrrl", mais um aliado da causa feminista.



CONTEXTO HISTÓRICO

Movimentos feministas, como o Riot Grrrl, não são novidade. Assim como não é notícia nova que as mulheres até hoje ralam demais pra cavar seu espaço na sociedade. A luta é árdua, e nos remete lá na Revolução Francesa.

N
o início do séc. XIX, a França apresentou diversas teorias baseadas no lema "Liberdade, Igualdade e Fraternidade". Nisso, mulheres se manifestaram para a reivindicação de direitos civis. Tais mulheres ganharam o apelido de suffragettes (tirado de "suffrage" = "voto"). Mas apesar dos ideais serem compatíveis, a sociedade ainda via as suffragettes de forma reticente.

Mesmo assim, essas francesas deixaram um legado, que abriu precedente para debates do tema, e encorajar seu aprofundamento. Em um desses estudos, em 1949, Simone de Beauvoir publica a obra "O Segundo Sexo", considerado um marco para o feminismo, por abordar questões da individualidade da mulher. Sua máxima é tida até hoje como referência: "não se nasce mulher, torna-se mulher".

Outra obra que seguiu esta linha foi "A Mística Feminina", de Betty Friedan, 1963. Ela ressalta que a mulher dever buscar sua personalidade fora do núcleo familiar, mas em si mesma. O livro foi inspiração para vários movimentos nos anos 60. Havia muitos questionamentos populares à política, a Guerra do Vietnã não era bem vista, e essa atmosfera se mostrou propícia para o debate feminista, que teve seu ápice no evento conhecido como "Queima de Sutiãs" em 1968.

A partir daí, mulheres em todo o mundo passaram a ocupar espaços na sociedade, passando pela política, trabalho e outros. E certamente que a música faz parte do rol. Artistas como Joan Jett, Madonna, Cindy Lauper, Alanis Morissette e várias outras entoaram o feminismo em suas músicas, e algumas delas serviram de modelo a Hanna e as precursoras do "Riot Grrrl". 



O DISCO

Tudo nesse disco transpira raiva! É um ódio explosivo, gritado, vomitado em todas as direções! A primeira sensação que tive quando o ouvi a primeira vez me lembrou outra história que já contei aqui, o "Plastic Ono Band": a mais pura demonstração de grito primal, instintivo e na cara!

E isso não se resumia só ao disco. As apresentações eram ainda mais explosivas. Hanna mandava os homens irem para trás, permitindo somente mulheres nas primeiras filas. Era comum também ela se despir no palco, e mostrar marcas desenhadas pelo corpo, normalmente palavras como "puta" ou "vadia". Francamente, não lembro de nada na música tão agressivo, revolto e inteligente ao mesmo tempo.

Todas as faixas seguem o padrão da raiva. Seja por reivindicação sexual (como em "Lil' Red", "Sugar" e "Magnet"), ou contra à hipocrisia masculina ("Star Bellied Boy" e a ótima "Blood One"), ou só um levante às mulheres ("Rebel Girl", "Alien She" e "Starfish"), a banda deixa claro que não vai poupar cusparada em quem duvidar da capacidade feminina. O único momento em "Pussy..." que me soa um pouco mais introspectivo é na faixa "For Tammy Rae", belíssima letra que faz menção a ex editora de zines com quem Hanna trabalhou.

"Pussy..." não é um primor técnico. Mas não é a questão aqui. Estamos falando de alguém que teve ousadia e coragem de traduzir em música o que toda mulher deveria pensar: "Garotas podem fazer qualquer coisa", como predissera uma adolescente Kathleen Hanna, em recortes de revistas.



LISTA DE FAIXAS

1. Blood One
2. Alien She
3. Magnet
4. Speed Heart
5. Lil' Red
6. Tell Me So
7. Sugar
8. Star Bellied Boy
9. Hamster Baby
10. Rebel Girl
11. Star Fish
12. For Tammy Rae
 



AVALIAÇÃO (0-10) 

Nota 7






P.S.: às mulheres que lerem este artigo, por favor me perdoem. O feminismo é um assunto muito amplo, tinha muito mais coisa pra falar sobre isso. Relevem minha falta de habilidade com o tema. Afinal... sou homem!

30 de jul. de 2012

"Camisa de Vênus" (Camisa de Vênus, 1983)

Capa de "Camisa de Vênus", de 1983


Imagine-se com 30 anos nas costas. Você já trabalhou como auxiliar de enfermagem, vendedor e radialista. Você morou alguns meses em New York (EUA) e fala com boa fluência o inglês. Você mora em Salvador - Bahia. É início da década de 1980, e você ama música mais que a si mesmo... mas não sabe tocar nenhum instrumento. Pegou o cenário? O que você faria? Provavelmente tentaria seguir carreira alí mesmo. Mas isso não bastava para Marcelo Nova. Criar o Camisa de Vênus era quase uma necessidade, que vinha de uma inquietação constante do estabelecido.


A BANDA

Marcelo Nova sempre teve esse "problema", nunca estava satisfeito com esse lance de "status quo". Começou a trabalhar cedo, ainda adolescente, como ajudante de seu pai, que tinha uma clínica de fisioterapia. O salário era todo convertido em discos. Em entrevista ao blog Imprensa Rocker, ele contou que não tinha interesse em nada, nem por "futebol, praia ou clube".

Quando qualquer um pensaria em seguir os passos do pai, Nova pede demissão e abre uma loja de discos. Foi a porta de entrada para a mídia. No fim dos anos 70, ele é convidado pela Rádio Aratu FM para apresentar o programa "Rock Special", pelo qual ganhou certa notoriedade nacional. Havia coisas que só ele conhecia, e rapidamente passou a se posicionar como formador de opinião.

Isso bastaria para que ele seguisse em uma emissora maior. Adivinha? Claro que não, preferiu vender a loja e usar o dinheiro pra morar em New York. Lá, conheceu o movimento punk e a filosofia "Do It Yourself" (que eu já tratei aqui no post "Ramones"). E foi o que bastou para voltar ao Brasil, decidido a formar uma banda. Contatou o amigo Robério Santana, e junto com Karl Hummel, Gustavo Mullen e Aldo Machado, funda o Camisa de Vênus, banda punk que ia na contramão de tudo que se entendia por cultura na comunidade baiana do começo dos anos 80.


CONTEXTO HISTÓRICO

Enquanto Nova engatinhava as ideias que formariam o Camisa, a música baiana estava mais que consolidada no Brasil, compreendendo os principais nomes e movimentos artísticos do país. Este status vem de muito antes, com suas origens na década de 60. Neste tempo foi quando houve o Golpe Militar, e os consequentes famigerados Atos Institucionais.

Nessa "zona", a cultura respondia em forma de protestos. Vários artistas surgiram com esta proposta, agregando aos ritmos regionais elementos de música estrangeira. Dentre os quais, destacam-se Caetano Veloso, Gilberto Gil, Tom Zé e dezenas de outros. A este movimento deu-se o nome de Tropicalismo.

O governo, certamente, reagiu, punindo com exílio a muitos deles. Claro que isso não diminuiu a força do movimento, que a essa altura já deixava um legado à cultura baiana. A década de 70, então, viu eclodir diversos outros artistas com expoentes diversificados. Dentre todos, destaco Armandinho (virtuose da guitarra baiana) e Raul Seixas, ambos inserindo mais elementos do rock às suas canções.

Raul, em especial, chamava muito a atenção de Nova. Suas canções, simples e sagazes, o inspiraram desde cedo à incursão musical. Agregando as ideias do Maluco Beleza com o DIY e o enfraquecimento do militarismo (também já citei aqui, em "Nós Vamos Invadir Sua Praia"), Nova não teve dúvida: o Camisa tinha de ser diferente de tudo. Era hora agredir todo mundo!


O DISCO


Não é a toa que o "Camisa de Vênus" incomodou na hora em que chegou. Tecnicamente, é um disco pobre. Mas era exatamente isso que Nova e banda queriam. Uma das coisas mais intrigantes que eu li naquela entrevista ao Imprensa Rocker é que, naquele tempo, não se fazia banda se você não fosse um Jimmy Page, ou um Jeff Beck. Mas quando conheceu Sex Pistols e The Clash, a coisa se tornou mais palpável.

Essa é a pegada que permeia todo o "Camisa...". O grande barato não é a parte técnica. Se o analisar assim, vai jogá-lo contra a parede nos 2 primeiros minutos. O mais admirável aqui são os textos.

Desde sua abertura, com a faixa "Passamos por Isso", Nova deixa claro que não vai poupar ninguém. Nesta, em específico, a "agulhada" vai direto no olho da MPB, em sua visão, engessada e pedante (e é mesmo). É o mais puro DIY com a anarquia, que se vê na maioria das faixas, como em "O Adventista" (em que o alvo são as pessoas que escolhem uma vida de alienação) e "Pronto pro Suicídio" (de novo, às pessoas, presas em suas rotinas).

A anarquia em "Camisa..." é, de fato, a palavra de ordem - paradoxalmente falando. Percebe-se isso em "Correndo Sem Parar" (minha preferida!), "Metástase", e "Passatempo". É soco atrás de soco, sem descanço, sem poupar ninguém, igreja, política, as pessoas em geral. A faixa que se tornou mais conhecida dessa obra, "Bete Morreu" é outro exemplo disso, bem como "Negue", um cover inusitadíssimo do clássico de Nelson Gonçalves.

Todos os seus 36 minutos de duração parecem ter sido projetados pra fazer você vomitar. E eu garanto, isso vai acontecer. Se você curte "ver o circo pegar fogo", eu te asseguro: você vai adorar sentir essa ânsia!


LISTA DE FAIXAS


1. Passamos Por Isto
2. Metástase
3. Bete Morreu
4. Correndo Sem Parar
5. Negue
6. O Adventista
7. Dogmas Tecnofascistas
8. Homem Não Chora
9. Passatempo
10. Pronto Pro Suicídio
11. Meu Primo Zé


AVALIAÇÃO 0-10


Nota 9

21 de jun. de 2012

Capas: Essa eu já vi... em algum lugar...

Eu já citei aqui no blog que a música, tendo milhares de anos de existência, é óbvio que alguma coisa vai sair parecida com a outra. Nem sempre se trata de um plágio. No mundo da música, coincidências ocorrem o tempo todo, sempre tem referências a artistas ou grupos em tom de homenagem, ou simplesmente se trata de falta de inspiração. Neste post, vou mostrar 10 dessas “coincidências” que aconteceram nas capas de discos.



Categoria da coincidência: Só coincidência mesmo.

New Life/Shout! (Depeche Mode, 1981)
Born Again (Black Sabbath, 1983)

Décadas atrás, era comum às bandas o lançamento de singles (um vinil pequeno, com só uma música em cada lado). O Depeche Mode não foi diferente, promovendo em 1981 a música New Life, futuramente no set do disco Speak & Spell. Dois anos depois, o Black Sabbath lançaria Born Again. Para a capa, chamaram o artista Steve Joule. Ele criou este desenho, meio que na intenção de que ele fosse reprovado. Para sua surpresa, Tony Iommi o adorou, e foi adotado para a capa desse disco.

A verdadeira "vítima".
E, como vê, ela é, em quase tudo, idêntica ao do single do Depeche Mode! Plágio? Não... e sim... talvez!

Acontece que, provavelmente por preguiça dos artistas, ambos tiveram a mesma ideia. Pegaram a capa de uma edição da revista Mind Alive e fizeram uma arte em cima da foto do bebezinho. Assim, comprovou-se que o Sabbath não plagiou o Depeche. Na verdade, ambos plagiaram a Mind Alive!







Categoria da coincidência: Homenagem.

Kill 'em All (Metallica, 1983)
Kill Emo All (Nitrominds, 2010)

Não vou contar de novo a história do Kill ‘em All. Já fiz isso, clica aqui e leia! Tá bom, só uma palhinha. Lars Ulrich botou uns anúncios no jornal, conheceu James Hetfield, Kirk Hammet e Cliff Burton, fizeram esse disco e inventaram o thrash metal. Quase três décadas depois o Nitrominds, banda brasileira de hardcore com certo renome, edita um disco de covers, com canções de suas influências, com uma seleção muito boa dentro dessa estética, com Pennywise, Police, Hüsker Dü, Ratos de Porão, entre outros.

Com a grande popularidade do Emocore ao final da década 2000, estilo não tão querido pelos fãs do Nitrominds, o grupo teve a ideia bem humorada de batizar o disco como Kill Emo All, uma corruptela do álbum do Metallica, consagrando também a sua arte. Afinal, os fãs do Metallica também não são lá tão simpáticos às bandas Emo.

Apesar disso, Kill Emo All não teve grande repercussão. Por isso, e outros motivos, a banda do ABC Paulista anunciou, em 11/06/2012, o encerramento de suas atividades.

Categoria da coincidência: Homenagem, mas com uma pontinha de sátira.

Elvis Presley (Elvis Presley, 1956)
London Calling (Clash, 1979)


Elvis é um dos maiores mitos do rock. Sua voz tinha extensão invejada, sua dança e trejeitos, o visual, a interpretação acelerada. Por isso, muitos o creditam como “Rei do Rock”, um dos primeiros ídolos do estilo. Mas o rock, como todos sabem, evoluiu conforme o contexto histórico. Assim, a década de 70 temperou o estilo com punhados de ideologia política e uma vontade incontrolável de chutar tudo. Denominou-se esse movimento como Punk. Nessa onda, puxada por Ramones e Sex Pistols, surgiu vários grupos, dentre os quais um dos mais importantes foi o Clash.

Como fãs do rock clássico, simples e pegado, como os músicos da geração de Elvis faziam, os integrantes do Clash editam, em 1979, London Calling. Para a capa, a homenagem é clara, mas a foto mostra que, no punk, o bicho pega! A foto, do baixista Paul Simonon destruindo seu equipamento, se tornou um ícone no estilo.

Curiosamente, o próprio Simonon detestava essa foto, e recomendou que ela não fosse usada para o London Calling!

Categoria da coincidência: Sátira. Descarada.

Sgt. Peppers... (Beatles, 1967)
We're Only... (Mother of Invention, 1968)


Pensa numa banda com tanta moral na gravadora a ponto de chegar e dizer: “Viu, a gente não vai mais tocar ao vivo, vamos trabalhar só em estúdio, ok?” Assim eram os Beatles desde o fim de 1966. Resultado: Sgt. Peppers, o disco mais aclamado da banda. A psicodelia era a onda do momento. E tudo que está em evidência, logo ganha seus contra-argumentos.

Foi nessa que entrou Frank Zappa. O prolixo líder do Mothers of Invention tinha um projeto de fazer um álbum de paródias. Algo semelhante ao Gates of Metal do Massacration. Quando Sgt. Peppers surgiu e sua repercussão tomou rumos de frenesi, Zappa não teve dúvida. Elaborou essa capa, claramente parodiando o disco dos Fab Four.

A original. Horrível!!
Mas os fãs do Mothers não chegaram a ver isso em 1968. É que o álbum era tão ácido que muitas coisas foram censuradas, de versos a trechos de letra inteiros, o que incluiu a arte da capa, substituída por uma foto ridícula dos integrantes. Esta capa, bem mais legal, foi publicada na reedição do We’re Only... em 1988.

Categoria da coincidência: Sátira.

Abbey Road (Beatles, 1969)
Vinte e Um... (Língua de Trapo, 2000)


Até a Turma da Mônica já atravessou essa rua!
Na verdade, quase tudo dos Beatles foi “homenageado”. As capas, claro, não são exceção. Esta então, acredito que é a capa que ganhou o maior número de paródias na história. Não pra menos, ela própria é uma paródia de si mesma. Na época havia uma lenda urbana que Paul McCartney havia morrido, e um impostor estava em seu lugar. Há várias dicas dessa suposta “verdade” nesta capa, como a sua foto descalço, o cigarro na mão destra, a placa do Fusca... Uma grande brincadeira dos Fab Four, usando os boatos a seu favor.

Bom humor é um recurso amplamente usado na música em geral. E para o Língua de Trapo, grupo paulistano em atividade desde 1979, rir de si mesmo é a linha-master de suas músicas. Eles fazem rock, basicamente, mas a banda trafega com conforto em vários outros estilos, de Bossa Nova a Pagode. Tudo com humor, abusando de metáforas, ironias, sátiras e qualquer outro recurso do riso.

Seu último disco oficial, datado de 2000, recebeu o sugestivo nome de “Vinte e Um Anos na Estrada”. E nada poderia ser mais clichê do que parodiar a clássica capa de Abbey Road.


Ouvir Abbey Road dos Beatles | Não tenho o Vinte e Um Anos na Estrada do Língua de Trapo, desculpe!



6. Let It Be (Beatles, 1970) X Demon Days (Gorillaz, 2005)

Categoria da coincidência: Homenagem.

Let It Be (Beatles, 1970)
Demon Days (Gorillaz, 2005)


Prometo, é o último disco dos Beatles que vai aparecer! Que posso fazer, os caras influenciaram quase tudo na música! Até este disco, Let it Be, lançado em data na qual a banda nem existia mais (o grupo terminou o Abbey Road e anunciou o fim das atividades), é considerado icônico por fãs e críticos. Seu legado se alastrou em todas as esferas da cultura, até hoje. Inclusive para influenciar Damon Albarn, ex-líder do Blur, a criar projetos musicais experimentais. De todos, o que obteve maior reconhecimento de mídia foi o Gorillaz.

Essa banda na verdade não é uma banda! Como é que vou explicar... bom, os Gorillaz, na verdade, não existem. São personagens de animação, desenhos, por assim dizer. É como se fossem uma “banda-gibi”: eles têm uma história, origem, influências, conflitos, ex-integrantes... mas tudo produto de criação de Albarn.

Seu 2º disco, Demon Days, usa a capa pra fazer uma clara referência aos Beatles, como homenagem a uma das primeiras bandas a usar personagens para identificar seus integrantes.

Categoria da coincidência: Sátira. Descarada.

The Spaghetti... (Guns n' Roses, 1993)
Feijoada... (Ratos de Porão, 1995)


O Guns sempre nutriu esse lance de “amor e ódio”. Apesar de suas músicas serem ótimas, o comportamento dos integrantes era meio autodestrutivo, chegando a sair no tapa com imprensa e fãs. Entre a banda, sempre houve controvérsia, e o início dos anos 90 decretaria o fim do grupo, ou pelo menos de sua formação clássica. A despedida foi melancólica: o disco Spaghetti Incident, só de covers, embora tivesse uma seleção interessante (com New York Dolls, Stooges, Misfits...), não teve boa recepção, e nem turnê teve.

Capa da seleção nacional
Enquanto isso, no Brasil, outra banda aproveitaria a onda de comemoração pela carreira e também lança um disco de covers. O Ratos de Porão, conhecido por seu punk escrachado, em 1995 edita Feijoada Acidente, trazendo suas influências. A seleção é bem legal também, tem Dead Kennedys, Dead Boys, Cascavelletes, Olho Seco e vários outros.

Diferentemente dos californianos, os paulistanos nunca se levaram muito a sério, e a capa de Feijoada... reflete isso. A paródia é explícita.

Categoria da coincidência: Só coincidência mesmo.

Movin' On (Commodores, 1975)
A Different... (Van Halen, 2012)


Desde 1959, a Motown se tornou referência em produção musical. Sente só algumas de suas “invenções”: Jackson 5, Diana Ross, Stevie Wonder... pra ficar só em alguns nomes! Dentre estes, está o Commodores, grupo de soul que catapultou a carreira de Lionel Richie. O 3º disco da banda é Movin’ On, e teve como principal sucesso a faixa Sweet Love.

Era só um poster sem graça...
Quando os Commodores já gozavam os benefícios do apadrinhamento da Motown, o Van Halen ainda tentava emergir. Conseguiram, lançando disco homônimo em 1978. E, como todo grupo de rock, eles sempre estiveram envolvidos em polêmicas e troca de membros. Com o retorno do vocal David Lee Roth, a banda lançou este ano seu mais recente trabalho. E, como dá pra ver, tirando um detalhe ou outro, as capas parecem ser rigorosamente as mesmas.

Ao ser divulgada, indagou-se o plágio por parte da trupe de Eddie Van Halen. Entretanto, assim como nas capas de Born Again e New Life, o que se verificou foi só uma coincidência. Ambos usaram a mesma foto pra compor a arte da capa.

Categoria da coincidência: Suspeita de plágio.

Open Fire (Alabama Thunderpussy, 2007)
Lwy Ognia (Open Fire, 1987)


O heavy metal eclodiu no fim dos anos 70, e de lá pra cá ganhou uma infinidade de subgêneros. Muita banda surgiu, mas nem todas conseguiram renome. Parece ser o caso do polonês Open Fire. Confesso que não achei muita coisa na internet dessa banda em língua que eu consiga ler, e mesmo este disco, Lwy Ognia, nem consta como oficialmente lançado.

O fato é que em 2007 o grupo Alabama Thunderpussy lançou o disco Open Fire (opa! De onde eu conheço esse nome?), e aquela é a capa (opa, opa!! É a mesma... ou impressão minha? Não, é a mesma!). O artista que a criou é Ken Kelly, que já fez capas para Manowar e Kiss. Esta arte lhes rendeu a reclamação de direitos autorais por parte dos ex-Open Fire.

Porém, os poloneses não têm nada registrado oficialmente deste bootleg. Já os estadunidenses de Virginia têm os documentos da propriedade da imagem, e alegaram nunca ter ouvido falar da banda europeia, nem do disco. Conclusão: inocentes. Pelo menos até que se prove o contrário.

Categoria da coincidência: Só coincidência mesmo. Mas com jeito lascado de plágio.

Another Fine... (Gilgamesh, 1978)
The Chemical... (Bruce Dickinson, 1998)


O Gilgamesh foi uma banda que fez parte da cena de Canterbury. Canterbury está para o Jazz Fusion, assim como Seattle está para o Grunge, mais ou menos isso. Já Bruce Dickinson dispensa apresentações. Mudou o Iron Maiden quando entrou, e ao sair pra carreira solo, gravou 6 discos, todos com mais repercussão do que os repetitivos “A Real ‘qualquer-coisa’ One” do ex grupo. Porém em 1998, foi acusado de plagiar a capa do disco do Gilgamesh no The Chemical Wedding.

William Blake, o "pai da criança"
O autor da arte de Chemical... é Hugh Gilmour, conhecido no ramo. Questionado sobre esta capa, deu uma resposta convincente... porém estranha. Primeiro, disse que nesta área “artistas são inspirados e influenciados uns pelos outros” (como se procurasse justificar a “cópia”). Depois, afirmou que tirou a ideia de uma ilustração de William Blake, de nome “Fantasma de uma Pulga”, de 1819. Assim como fizera o Gilgamesh, duas décadas antes.

De fato, a ilustração de Blake respalda claramente o argumento de Gilmour. Mas, cá pra nós, que ficou com jeito de desculpa esfarrapada, ficou!




E o artigo chegou ao fim. Você já conhecia algumas das histórias que contei aqui, talvez algumas lhe sejam novidade. Espero que o entretenimento tenha sido bacana.

Mas... eu citei só 10 casos. Com certeza, deve haver mais, muito mais. Você conhece algum outro?