20 de mai. de 2011

“Bonito, Lindo e Joiado” (Falcão, 1991)

Capa de "Bonito...", de 1991.



E para não dizer que este blog só fala de rock, a resenha de agora trás um artista... “diferente”! Marcondes Falcão Maia, ou somente Falcão, era o cara que tinha tudo pra dar errado na música: voz nasalada, não toca nenhum instrumento com grande destreza, aptidão pra ciências exatas... Tudo levava a crer que ele seria um empregado comum em algum escritório, mas se tornou uma das maiores referências em música brega.


O MÚSICO

Como já falei no parágrafo de abertura, Falcão tem grande facilidade com ciências exatas e raciocínio lógico. Em 1978, aos 21 anos, forma-se em um curso técnico de edificações. Dez anos depois, gradua-se em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal do Ceará.

Com mais de 30 anos e formado por uma federal, era de se supor que ele teria seguido uma carreira brilhante em sua área de graduação. Mas o que poucos sabem é que, desde a adolescência, Marcondes também se arriscava na música. Há aquela altura, ele já tinha participado de vários festivais, apresentando suas composições (algumas utilizadas neste disco) com a banda Fragmentus.

Só que em 1988 seria o ponto de virada. Além do canudo, o cantor faria, ao fim daquele ano, sua primeira apresentação solo. O show, cheio de firulas e trejeitos bizarros, foi sucesso entre o público, que ria com as letras inusitadas e o figurino “joiado” do artista.

Isso o encorajou a seguir carreira, paralelamente à profissão de arquiteto. E em 1991, o que deveria ser apenas um “hobby divertido”, acabou se tornando mais sério. Nesse ano, o cantor editou este disco, primeiro independente, depois sob o selo da gravadora Continental. A carreira de músico começava a bombar, e Falcão sai da sociedade no escritório de arquitetura que fundara anos antes, para se dedicar só às suas “esculhambações”.


CONTEXTO HISTÓRICO

Eu até queria fugir do lugar comum de falar sobre a tradição do Estado do Ceará em produzir humoristas, mas não tem como. Essa é a verdade, um bom número dos melhores produtores de risada deste país surgiu desse Estado, como Chico Anysio, Tom Cavalcante e Tiririca.

Aliar humor à música sempre foi uma fórmula amplamente usada, ainda mais para músicos da região nordeste do Brasil, onde a “safra” de humoristas sempre foi grande. E o nome de maior destaque, que prevaleceu durante vários anos desde a década de 80 foi o do paraibano Genival Lacerda. Unindo forró com letras irreverentes e de duplo sentido, Lacerda foi sucesso em todo o território nacional. Suas músicas “Severina Xique-Xique”, “Tico-Tico” e “Radinho de Pilha” ecoam até hoje em vários falantes Brasil afora.

Falcão apenas segue o “legado” de Genival Lacerda. A diferença é que ele tocou num ponto mais abrangente: o flerte com a MPB. Se Genival se restringia ao forró (que, embora popular em todo o Brasil, tem mais força no Nordeste), Falcão usa recursos de diversos ritmos, que vão desde o rock até o hip hop, passando também por “crooners” clássicos da música nacional, tais como Waldick Soriano e Almir Rogério.

Dessa forma, Falcão não só faz as pessoas rirem, mas também retoma à memória do povo esses artistas que foram sucesso em décadas passadas, e que andavam esquecidos com tanta maluquice que aconteceu com a música no passar de todos esses anos.


O DISCO

Mesmo que você seja fã de um único estilo de música, seja rock, pagode ou qualquer coisa, ouça esse disco com atenção. Note, com cautela, a estética de cada música. Você vai notar que cada faixa desse disco flerta com um estilo diferente.

Por exemplo, a faixa n.º 1, Merenda Escolar. Ao ouvinte desavisado, quando escutar os primeiros acordes, terá a mais absoluta certeza que se trata de um disco de hard rock! Claro, somente até entrar a voz fanhosa de Falcão. Outro exemplo, na segunda faixa, Canto Bregoriano II, é clara a referência estética de música católica.

Todo o disco segue essa tendência, estilos misturados, ritmos fundidos, e um monte de referências que vão fazer você dizer “Ahhhhh, eu conheço isso!!!” Exemplo está na faixa Oportunidade Única. Quem tiver mais de 30 anos vai reconhecer o velho “jingle” da Caixa Econômica Federal. E em Um Bodegueiro na FIEC, é muito óbvia a referência a “Burguesia”, clássico criado pelo falecido cantor Cazuza. Agora, me diz se não é hilário: “Eu sei que a burguesia fede, mas tem dinheiro pra comprar perfume”! Genial!

Destaques também para as faixas A Cura da Homeopatia pelo Processo Macrobiótico (cuja letra, cheia de termos regionais, mostra como ficar mais feliz com uma alimentação... digamos... beeeeeeeeeem balanceada), e I’m Not Dog No, sendo esta talvez a música mais conhecida do disco, em uma versão em inglês absurdamente macarrônico do clássico Eu não Sou Cachorro Não, de Waldick Soriano.

Você só ouve rock? Cara, esquece isso um pouco e ouve esse disco! Se você não rir em nenhuma faixa, pode se internar!


LISTA DE FAIXAS

1. Merenda escolar
2. Canto Bregoriano II
3. I'm not dog no
4. Vão-se os cabaços ficam-se os desgostos
5. Sou mais no tempo do Figueredo
6. O amor que antes de ser já era
7. Oportunidade única
8. Desamassamento, solda e pintura
9. A cura da homeopatia pelo processo macrobiótico
10. Só é corno quem quer
11. Um bodegueiro na FIEC


AVALIAÇÃO 0-10

Nota 7.


LINKS

10 comentários:

  1. Admito q me surpreendi ao ver q o próximo escolhido seria do grande mestre Falcão. Mas acho q foi mais felicidade e empolgação. Por outro lado não me estranha q vc pudesse tb admirar a 'capilogência' deste figura gigante! hehe

    Primeiramente então, meus parabéns pela escolha! Já foi no mínimo nota 7! Com ótima resenha então foi 10!

    Falcão é um daqueles renegados q nos livram dos clichês, modismos e carnes d vaca tão populares n só no Rock, mas em qq estilo.
    Como vc msmo abordou, ao menos a letra o sujeito q escuta tem q tirar o chapéu!

    'Bonito, lindo e Joiado' é uma ótima estreia. Deste Falcão emplacou a magnífica versão de Eu não sou cachorro não (q já no disco seguinte a fórmula seria repetida - e melhorada, na minha opinião - com Black People Car)

    Há ainda de se destacar a já citada Merenda Escolar (quem não se lembra daquela gororoba estatal!?), a balada engraçadíssima de O Amor que antes de ser já era - em que ele explica o pq d n ter dado certo: "E é porque meu pai tinha um parente
    Que era amigo de um soldado
    Que morava em frente à casa de um vereador" e finaliza: "E eu vim contando jumento na estrada pra te esquecer".
    Mas minha preferida deste disco é Um Bodegueiro na FIEC q possui a sapientíssima frase já citada.
    "Com o maior respaldo" falo do Falcão pq sou fã e d td sua discografia tenho como preferidos o "A Besteira é a base da sabedoria" e o "Do Penico à Bomba Atômica" (um dos melhores títulos de álbum q já vi). Esses, dsd já, deixo sugestões de resenha pro futuro, Fabio!

    Parabéns pela homenagem ao Falcão, Fabião!

    Buli

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  2. Valeu Buli. Suas sugestões são sempre ótimas!



    É verdade, a faixa "O Amor que Antes de Ser Ja Era" é uma das melhores. Aliás, só o nome das músicas já é a piada pronta! Hehhehee!

    Concordo contigo, o disco "A Besteira é a Base da Sabedoria" é o melhor dele. Todos os discos terão sua resenha, mas tem que esperar um pouco. Tem que dar chances para artistas de menor expressão, tipo os Beatles por exemplo. Kkkkkkkkkkkkkkkk!


    Abraço

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  3. Hauahaua boa!
    Mas fico contente q as resenhas ainda virão!
    Falcão é uma puta influência pra mim, to repassando a discografia dele agora mesmo

    Sim, mtas das suas músicas já tem piada formidável no próprio título. Ex: A Terra há de comer (já que não comi), Se eu morrer sem gozar do teu amor, minha alma lhe persegue de pau duro e a mais famosa, Holiday foi muito. Simplesmente demais! Q raios ele quis dizer c/ isso afinal? Misto de extrema desenvoltura espontânea e genialidade

    Abraço!

    Buli

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    1. Acho que com essa música "Holiday Foi Muito" ele quis dizer "Já Lhe Dei Foi Muito"... Rsrsrs...
      A voz nasalada dele permite muitas interpretações nas palavras que ele diz... rsrsrs...
      Essa música é muito bonita, a melodia é bela mesmo. A poesia esculhambada se casa muito bem com a melodia, e justamente por ser tão esculhambada é que a poesia também se revela muito bonita também. Rsrsrs.
      Falcão é o rei dos paradoxos frasais. Não tem outro aqui no Brasil que vá com ele nisso. O mais interessante é que apesar de a gente saber que o esculacho das letras é grande, todos achamos a poesia dele interessante. Mesmo quem não curte o jeito dele de fazer poesia, nunca deixa de prestar atenção nela. E ainda mais com as melodias, que são de primeira!
      Falcão! Mestre Incopiável!

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    2. É exatamente isso aí, "anônimo". Particularmente, também acho o Falcão o campeão dos trocadalhos! kkkkkk!

      Abraços, obrigado pelo comentário!

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    3. Ele é o campeão dos paradoxos proverbiais, frasais, e das tonalidades musicais. E põe trocadalho nisso. Rsrsrs.
      Valeu também, meu chapa! Muita gente despreza Falcão porque nunca se dispôs a parar um pouco pra ouvir as músicas dele prestando atenção. Já nós, os fãs do mundo musical falconiano falamos bem dele porque temos conhecimento de causa o bastante pra saber a qualidade do trabalho dele, e sabemos que tem qualidade porque conseguimos parar pra ouvi-lo. Haja fuleragem, sacanagem, mas também muita sabedoria de vida e de tudo um pouco! E além de tudo isso, a qualidade musical do trabalho dele é inegável, disso não há dúvida alguma! Nada na música do Falcão é sem sentido, por mais doido que pareça!
      Valeu também, Fabio, e continue com este blog, pois está nota dez, amigo! E esperamos mais resenhas suas! É a divulgação da verdadeira Música Popular Brasileira com Triângulo e Roe-Roe! Rsrsrs!

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  4. Ah, ainda devo o comentário das Runaways e do Guns! N esqueci n, mas vou ouvir o álbum antes!

    Buli

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  5. Tranquilo, meu velho! Ouça os discos, principalmente o das meninas. Garanto que você vai se surpreender!


    Abraço

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  6. Falcão não tem outro aqui no Brasil! No estilo dele (ninguém sabe realmente qual é o estilo desse cara! Kkkk!) ele é hors concours, sem dúvida! Melhor cantor e compositor pop-brega, na minha opinião... embora eu ache que, apesar de todas as aparências, a música dele nada tem de brega! Já compararam Falcão a Raul Seixas, Cazuza e Renato Russo. Mas eu acho Falcão muito melhor que os outros 3, embora reconhecendo o valor dos outros 3. A música do Falcão simplesmente fala mais aos meus ouvidos, me toca mais!
    Acho que os melhores álbuns do Falcão são os três primeiros, "Bonito, Lindo e Joiado", "O Dinheiro Não É Tudo, Mas É 100%" e "A Besteira É A Base da Sabedoria". Mas eu ainda prefiro o disco de estreia! Pra mim, nele Falcão se revela de um jeito como poucos músicos na MPB tiveram coragem de se revelar! O que ele faz é pura MPB, as melodias são muito bonitas, o acompanhamento é de primeira e as letras é que dão o toque de tudo, junto com a voz inigualável dele! Realmente, quem não achar que Falcão é um grande compositor, e, principalmente, quem não rir à beça com o trabalho dele, precisa se internar urgentemente! Kkkk!
    Grande Falcão! Pra mim, um eterno da MPB, inesquecível, inimitável, o mais atrevido cantor e compositor brasileiro de todos os tempos! Nota dez pra ele! E a música que mais gosto dele, sem dúvida alguma, é "Vão-se Os Cabaços, Ficam-se Os Desgostos". Não sei qual é o ritmo da música, mas acho a melodia linda e o acompanhamento é de fazer inveja a muitos outros medalhões da MPB por aí! E a letra escrachada dá o toque final! Kkkkk!
    Viva Falcão, e viva o Ceará, esse nascedouro de grandes músicos, poetas e, principalmente, de grandes humoristas!

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    1. Concordo, este disco é um dos melhores mesmo. Meu preferido é "A Besteira é a Base da Sabedoria". Mas já ouvi várias vezes todos os demais, cada um deles tem algo bacana pra tirar.

      Outro disco que aprecio muito é "A Um Passo da MPB", sem dúvida um dos mais engraçados de Falcão.

      Valeu por comentar o post no blog, sinta-se livre para ver as demais resenhas... apesar de já há muito tempo eu não publicar nada! Quem sabe em 2014 torno a publicar resenhas?

      Abraço

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